Há um prazer singular em ver – e ouvir – trabalhar os “amigos do alheio”. Não os carteiristas e corruptos, a cujos espectáculos muito diversificados assistimos todos os dias, infelizmente, e sem hora ou palco previamente anunciados. No caso, estou a referir-me aos que, em sentido mais literal, se deixam deslumbrar e seduzir pela grandeza de terceiros e gerem esse sentimento de uma forma activa: em vez de se limitarem a aplaudir e a evocar, partem para propostas transformadoras, para abordagens inéditas e/ou insólitas, para exercícios de um saudável revisionismo estético, mais assinaláveis ainda se acabarem por se constituir como valores acrescentados.
Pura ilusão, a de que se trata de um processo fácil, se pensarmos no universo da Música Popular. Nada disso: passa pela identificação e assimilação, segue pelo estudo da essência e pela captação da alma, continua em direcção ao que se pretende alterar e à forma como se procede à desfocagem inicial para, enfim, rumar a um desfecho que casa a lição apreendida com uma nova personalidade própria. É, então, algo de compensador e – nos melhores exemplos – transcendente, porque as mesmas pistas, o mesmo mapa, acaba por nos conduzir a um tesouro muito diferente, na substância e na “localização”.
António Variações, Xutos & Pontapés, Rádio Macau e Sétima Legião, entre outros. Em cerca de três quartos de hora, disputa-se aqui a segunda parte de um jogo em que ninguém fica a perder, até por não se tratar de uma competição, mas tão só de uma afirmação.
Fico feliz com o resultado final. E com a certeza de que estas versões acabarão por despoletar novas aventuras e outras releituras. Acreditem: é um trabalho de amor e de resistência. E mostra a grandeza inesperada e múltipla da rota da Seda, uma viagem feito com rumo e sem pressas. Eu alinho.
Texto de João Gobern (jornalista e critico)
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